Georgina
Um dia, ainda eram eles pequenos e tinham todas as maleitas, regressávamos uma vez mais do hospital. Já não sei qual maleita e qual deles. Vínhamos cansados e com fome. Abri o frigorífico e vi vazio; ela olhou e reconheceu um banquete. Alexandre, dê-me esses dois ovos, esse resto de peixe, essa cenoura, um pouco de leite. E dali nasceu um soufflé que ainda hoje recordo, umas décadas depois. Delicioso aconchego para quem tinha passado horas num hospital.
Assim era a Georgina.
Roubei-lhe a filha, como ela dizia, mas ganhei uma bonita amiga para toda a vida, uma segunda mãe, uma generosa avó para os meus príncipes, uma família, deliciosos repastos, o segredo da cinza na arte de grelhar peixe, o gosto pela comida feita com amor, com sabor.
Uma chata que me vai fazer muita falta.
A vida é uma merda, dizia ela, mas ela não queria partir, não queria deixar de viver.
Não te preocupes, ficamos bem, o teu trabalho está feito, eu cuido dela e dos teus netos. Não mais terás de sofrer.
A vida é mesmo uma merda, mas tu ajudavas a que não fosse. Agora, precisas dormir, está na hora de descansares, de largares os tachos.
E Tu aí em cima, seja lá quem fores, recebe-a bem.
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