Passagem

A emergência da primeira vaga, deu lugar a um quase desprendimento neste segundo recolhimento. Existem momentos em que me esqueço do tal estado em que estamos, faz quase um ano. Acho que me habituei a este novo viver., a estar em órbita. Começo a duvidar se algum dia voltarei à anterior realidade, às mesmas rotinas, com os mesmos rituais. Repito-me preocupantemente. Habituei-me, talvez todos nos tenhamos habituado, às novas rotinas, ao espaço limitado, a este modo de estar. Entranhou-se. Os números ontem, hoje, nos últimos dias, são escandalosamente baixos. Estão a cair a pique. Como é possível? Ainda ficamos em maus lençóis. É muito perigoso. O que faremos quando isto já não for? Vamos ter de iniciar, de novo, o caminho de regresso, agarrar o fino fio que nos liga lá atrás, receosamente ir saindo do túnel onde nos enfiámos faz meses, descer a montanha, aterrar a nave de novo na planície, emergir. O que sentiremos quando a porta se abrir, quando a luz nos bater nos olhos, o ar puro nos penetrar as narinas, sentirmos que tudo isto já não é, tirarmos a máscara que nos cobre o rosto? E nesse momento, sentiremos algo novo? Seremos confrontados com a liberdade perdida, o assombro do desconhecido, o vazio do que era e deixou de ser, o chão firme debaixo dos nossos pés. Talvez, tão simplesmente como em tudo, não haja um fim e um princípio, mas tão somente uma passagem. #VaiFicarTudoBem.

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